Sempre digo que tudo que um ilustrador precisa para começar a ser um profissional é ilustrar. Ilustrar o máximo que puder. Ter muitos desenhos, praticar muito. Esse é o primeiro passo. Procurar trabalhar nisso de 5 a 10 horas por dia e verificar como se sente. Se estiver bem disposto apesar de um dia inteiro de trabalho, então terá disposição para seguir nisso, sentirá prazer e poderá dar conta das exigências do trabalho. Se puder seguir nesse ritmo ao longo de algumas semanas e ainda assim se mantiver disposto, então já pode se considerar um profissional.
Pode soar estranho, mas de fato não é necessário estar inserido no mercado, ter encomendas e clientes, ter uma história e trabalhos publicados para ser considerado um profissional. Basta ter a postura de valorizar nossa tarefa acima de todas as outras coisas. Acima do cliente, acima da remuneração, acima do tempo, acima de nós mesmos e do nosso próprio ego. O que importa é nossa tarefa, tudo o mais é irrisório. Se há que representar uma planta, um animal, um fungo, uma interação biológica etc., tudo o que se deve almejar é a melhor forma de realizar o trabalho. Se for preciso fazer exigências ao cliente, como providenciar materiais melhores ou mais apoio (pense na amplitude do significado da palavra apoio), isso deve ser feito. O cliente não é mais importante do que a tarefa. Cumpri-la bem é tudo a que um verdadeiro profissional visa.
Quem se sente apto a agir desse modo já deve se considerar profissional.
Depois de estabelecer essa postura interna, entretanto, é necessário estar colocado no mercado. Isso é outra história. Depois de já haver praticado, de já estar apto a considerar seu trabalho a coisa mais importante do universo a partir do recebimento da tarefa, é preciso atrair tarefas. Como se consegue isso?
Primeiro, devemos nos convencer de que ilustradores são muito necessários. Os pesquisadores precisam deles o tempo todo. Precisam de muitos deles, dezenas, centenas. Não ficam contentes se não podem escolher ilustradores como quem escolhe pêssegos no supermercado. Querem ver os desenhos, avaliar, pesar relações de custo/benefício. Mas não podem, porque ilustradores são muito raros e nunca têm tempo. Portanto, quem deseja clientes só precisa abrir a boca de alguma forma para dizer: "eu sei desenhar bem".
Há várias formas de abrir a boca. E agora vamos permear um campo que pode ser mais subjetivo aqui ou ali na questão da propaganda. Gosto de defender a ideia da sedução do cliente. Penso que temos que nos inspirar em alguns ritos de sedução animais (incluindo humanos, mas com mais vistas aos ritos dos felinos) para compreender como é que se seduzem clientes. Por isso defendo sempre a ideia de evitar pedir ou se oferecer demais, mendigar, implorar. Quem precisa disso já passa impressão de fazer um trabalho pouco valoroso. A ideia implícita é a de que um bom ilustrador não ficaria precisando mendigar. Isso não corresponde à realidade, há muitos excelentes ilustradores sem trabalho por motivos diversos. Mas isso não altera em nada a impressão passada por alguém que pede ou implora trabalho.
Assim, creio que o meio termo seria oferecer-se de forma não muito explícita. Uma das formas é divulgar seu trabalho sem associar a essa divulgação a busca por encomendas. Por exemplo participando de mostras e afixando cartazes divulgando essas exposições nos locais onde os potenciais clientes circulam.
A forma que me agrada muito é ilustrar nesses locais. Sentar defronte a uma planta e desenhá-la ali mesmo. Devemos escolher bem, para não ser nada forçado. A intenção é acima de tudo desenhar e não angariar clientes. Se estivermos ali só com a intenção de obter trabalho, essa postura será inconscientemente transmitida e decifrada pelos transeuntes, até por meio de nossa atitude corporal. Devemos nos concentrar e esquecer do entorno; nossa tarefa é ilustrar, e deve estar acima de tudo.
O cartaz de divulgação pessoal funciona muito bem. É uma forma de se manter sempre na lembrança das pessoas, e sempre sendo conhecido pelos novos pesquisadores das instituições. Já traz uma amostra de nosso trabalho, e estando ali apenas o cartaz, sem nossa presença pessoal, já passa a impressão de que o ilustrador está em casa, trabalhando. É bem diferente de passar de porta em porta solicitando encomendas. O cartaz é uma boa oferta mais ou menos desinteressada e nada é mais sedutor do que uma oferta que parece desprezar. Pessoalmente, apesar de não usar cartazes, defendo a postura de que, uma vez colocado, seja o cartaz mantido constantemente presente, assim já se torna uma marca pessoal do ilustrador.
Por vezes divulgar tranquilamente sua intenção de entrar no mercado pode ser tudo que as pessoas precisam saber. Eventualmente basta abrir a boca e dizer a algum colega que pesquise: "estou a fim de ilustrar" e as portas começam a se abrir, pois o seu colega pode já conhecer seu desenho. Assim, ou indicará seu trabalho ou solicitará ele próprio.
Apesar de toda essa delonga, a postura na qual mais me fio, e a que mais gostaria de poder persuadir a todos experimentarem, é a de ter consciência do valor de nosso trabalho. Quem valoriza seu trabalho dignifica-o, e isso é o mais forte atrator de clientes. Quando valorizamos nosso trabalho acima de tudo, produzimos algo bem maior do que nós, e é essa grandeza que tem o poder de agir em prol de si mesma. Não creia em mim, experimente!
Bem-vindos à profissão!